O que eu aprendi sobre vida e morte com Alistair Overeem

Tempo de leitura: 7 min

em maio 7, 2021

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O que eu aprendi sobre vida e morte com Alistair Overeem

O caminho das artes marciais exige que você saiba extrair aprendizados de todas as situações vividas dentro da área de treinos e de lutas.

E mais do que isso, você deve encontrar formas de aplicar esses aprendizados em todas as áreas da sua vida.

Mas não se engane. Qualquer que seja o caminho que você segue em sua vida, você precisa entender que, tudo o que você aprende tem potencial para te tornar uma pessoa mais completa.  Isso não é, de forma nenhuma, exclusividade das artes marciais.

Hoje, você saberá o que eu aprendi sobre vida e morte ao enfrentar Alistair Overeem. Confira!

Meu início no K-1

Em abril de 2008, fiz minha estreia no K-1, maior evento de kickboxing da história.

E assim como meus antecessores Francisco Filho e Glaube Feitosa, esta foi não só minha estreia no evento, mas a primeira luta de kickboxing da minha vida.

Havia conquistado em novembro de 2007 o título de campeão mundial aberto de karatê kyokushin. Com o título, veio o convite para representar minha arte marcial no K-1.

Convite aceito, parti para a Ichigeki Academy no Japão, em fevereiro de 2008 para me preparar para a minha estreia.

Em minha primeira luta no evento, enfrentei o japonês Yusuke Fujimoto. Venci por nocaute após dois rounds extra, mas foi uma luta onde me senti totalmente perdido.

Ali, descobri como era uma luta de kickboxing e o quanto eu precisaria evoluir.

As lutas seguintes

Dois meses após a estreia, participei do torneio K-1 Japan GP, que era composto por 8 atletas. Venci 3 lutas e me tornei campeão do K-1 Japan GP de 2008.

Já havia evoluído um pouco como lutador, mas sabia que ainda precisaria evoluir mais, pois meu objetivo sempre foi conquistar o K-1 World GP.

Falando em World GP, três meses após a conquista do título japonês, enfrentei Musashi nas eliminatórias que classificavam para o GP do final de ano.

Venci por decisão dos juízes e conquistei a vaga para o evento.

Minha primeira derrota no K-1

Em minha primeira luta no GP enfrentei o surinamês Errol Zimmerman.

Comecei a luta de forma muito intensa e, no terceiro round, meu gás já tinha acabado.

Sofri um knock down no terceiro round e acabei perdendo a luta por decisão dos juízes.

O campeão desta edição do GP foi Remy Bonjaski, que fez a final com Badr Hari.

Meu ano de 2009 no K-1

Apesar da minha derrota no GP de 2008, considero que fiz um ano bom.

E isso me deixou bem animado para treinar mais e mostrar meu potencial no ano de 2009.

Logo no início do ano, recebi a notícia que enfrentaria um dos meus ídolos no K-1, Jerome LeBanner.

Fiquei muito animado e treinei muito, como sempre. Porém, a luta não foi tão boa quanto eu esperava. Venci após dois rounds extras.

O mesmo aconteceu meses depois, na eliminatória para o GP de 2009 contra Singh Jaideep.

Venci e me classifiquei para o GP, onde foi decidido por sorteio que meu primeiro adversário seria Alistair Overeem.

Estratégia para lutar com Overeem

Minha equipe e eu assistimos às lutas que ele havia feito anteriormente no K-1, e concluímos o seguinte: quanto mais a luta se estender, melhor para nós.

Então decidimos que, no primeiro round, eu manteria a distância, focando na aplicação de chutes. A partir do segundo round, eu começaria a pressionar mais, combinando socos e chutes.

Para que eu conseguisse manter a distância e entrar e sair do raio de ação de Overeem com velocidade para aplicar meus chutes, foquei muito em ganhar velocidade.

Em média, pesava 108 quilos para minhas lutas no K-1, mas para esta, estava com 105 quilos, mesmo peso que estava quando fui campeão mundial de kyokushin. Após um intenso período de preparação, me sentia bem, preparado e confiante.

Sentimentos antes da luta

Para a maioria das pessoas, é difícil entender o sentimento de dividir um ringue, tablado, tatami ou cage com um adversário.

A sensação de nervosismo, adrenalina, frio na barriga, medo ou qualquer nome que você queira dar, está presente em todas as lutas. E o lutador que não sabe controlar isso, não vai muito longe.

Eu, particularmente, senti este frio na barriga em todas as minhas lutas. E quando digo todas, é todas mesmo.

Porém, a razão principal de isso acontecer não era o tamanho do adversário, nem a possibilidade de eu me machucar durante a luta. O que me deixava com medo era a preocupação em não conseguir aplicar tudo o que eu havia treinado.

Por isso, não havia um lutador que me deixasse com mais medo que outro. Desde pequeno, brigava com moleques maiores que eu, então tamanho não era um fator que me intimidava.

Apesar de este sentimento estar presente em todas as minhas lutas, nunca me atrapalhou. Sempre consegui negociar com ele.

Com Overeem não foi diferente. Senti a mesma coisa que senti antes das lutas anteriores a essa, e com a mesma intensidade. Nem mais, nem menos.

A luta

Bom, assisti à luta algumas vezes, mas me lembro pouco dos momentos em que estava no ringue.

O que eu me lembro é de me sentir bem e rápido. Depois, de ser acordado por alguém. Apenas isso.

Depois que me explicaram o que havia acontecido, fiquei sem acreditar.

Com tão pouco tempo de luta, não pude colocar o que havia treinado em prática. Havia treinado sério, estava em boa forma, mas tudo acabou de forma tão rápida.

Em um ano de lutas que não haviam me deixado satisfeito, finalmente havia experimentado uma espécie de morte no evento principal do ano.

Porém, como eu ainda tinha mais um ano de contrato, a única forma de lidar com isso era através de um renascimento.

Renascimento após a morte simbólica

O ano de 2010 havia começado e eu tinha em mente que precisaria renascer para realizar meu sonho de me tornar campeão do K-1 World GP. E esse renascimento veio em forma de uma mudança de ares.

Eu havia passado todo o período em que estava lutando kickboxing treinando no Japão, com exceção de um período que treinei boxe no Brasil, antes da luta contra Jaideep.

Com isso, foi acordado entre o kyokushin e eu que eu passaria por um período de dois meses de treinamento na Holanda, mais precisamente na Mejiro Gym.

A academia, que é o berço do kickboxing holandês, também tem o kyokushin em suas raízes.

Mas não me entenda mal. A academia em que eu treinava no Japão era ótima.

Lá, eu tinha oportunidade de ser treinado por Jayson Vemoa, Maurício da Silva e Faii Falamoe, além de treinar frequentemente com Ray Sefo, Jan Nordje, Alexander Pichkhounov, Jan Soukup, Koh Taisei, Takumi Sato, entre outros. Ou seja, era um time muito bom.

Só que, desde que eu havia chegado lá, era como se eu estivesse aprendendo tudo do zero. Eu não estava conseguindo conectar o que eu já sabia com as novas regras em que eu competia.

Com isso, parti para a Holanda, onde dormia no andar de cima da academia e buscava aproveitar ao máximo o treinamento oferecido pela Mejiro.

Um novo lutador

É engraçado como, em um período tão curto, temos a oportunidade de fazer pequenos ajustes que trazem grandes resultados.

Foi isso que aconteceu no meu período treinando na Holanda.

Não havia aprendido algo muito diferente do que já vinha fazendo, mas os ajustes feitos em alguns detalhes do meu jogo fizeram total diferença.

Andre Mannaart, treinador responsável pela Mejiro Gym, tem uma didática excepcional. Ele consegue enxergar os pontos fortes de um atleta, fazer ajustes e desenvolvê-lo com muita velocidade.

Agora, finalmente, conseguia aplicar meu karate nas regras do kickboxing.

No meu retorno, venci Alex Roberts por nocaute na Austrália, fiz uma luta muito boa com outra lenda Peter Aerts, e venci Errol Zimmerman no final do ano.

Este foi meu melhor ano no evento, que mudou de direção no ano seguinte.

Sobre a morte e o renascimento

Existem momentos em que experimentamos uma espécie de morte ao longo de nossas vidas. Nestes momentos, o importante é descobrir como fazer para renascer mais fortes do que antes.

Na verdade, ciclos de mortes e renascimentos simbólicos são uma constante na vida de um lutador. Porém, uma morte violenta pode fazer com que você renasça como a sua melhor versão.

Esses momentos exigem autoconhecimento, humildade e disposição.

E, por mais que isso pareça contra intuitivo, conselhos externos têm maior potencial de te atrapalhar do que te ajudar nestes momentos.

Caso você passe por um momento assim, ouça sua voz interior, entenda o que precisa ser feito e aja.

É importante também que você não se prenda a dogmas e aprenda a olhar para o problema que você precisa solucionar por diferentes ângulos.

Entenda que não existe apenas uma forma de alcançar aquilo que se deseja.

Você não precisa descartar o que já sabe, mas é necessário que você conecte isso a novos conhecimentos que realmente te ajudarão a solucionar um problema específico.

Assim, você corre menos risco de se tornar um fantasma que fica vagando sem se dar conta de que não vive mais, e aumenta suas chances de ser como uma fênix, renascendo mais forte de suas próprias cinzas.

Portanto, se está passando por um momento ruim, não se entregue. Recomponha-se e trate de encontrar uma forma de renascer mais forte.

E você, já passou por algo parecido? Deixe nos comentários!

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11 Comentários

  • Bashist disse:

    Loved your explanation. Osu

    1. Ewerton Teixeira disse:

      Thank you very much! Osu!

  • Newton Mendes disse:

    Treino karate desde a infância, hoje tenho 36 anos, sempre fui fascinado por artes marciais e tive um amigo que treinou kyokushin e foi através dele que conheci o karate mais forte.
    É incrível como as artes marciais podem nos ensinar tanto, com essas narrativas de lendas do esporte podemos nos inspirar cada vez mais.

    1. Ewerton Teixeira disse:

      Pois é. Da prática devemos tirar lições constantemente, aplicar a nossa vida diária, e compartilhar. Obrigado por ler. Grande abraço!

    2. Nelson Pires Romera Junior disse:

      Osu!
      Sensei, obrigado por partilhar, de forma absolutamente clara conceitos sobre a vida. Se aceita uma humilde sugestão, você poderia, quem sabe um dia, criar um livro com exatamente essas experiências descritas aqui. Seria um presente a todos os atletas do mundo sem exagero pode acreditar. Não tem dinheiro que pague esse seu ato de dividir conosco suas experiências de vida e luta. Por favor, no futuro, pense em um livro.
      Fique com Deus! Agrande abraço!

      1. Ewerton Teixeira disse:

        Eu que agradeço pela leitura. O livro está nos meus planos sim. Na verdade estou com o esqueleto dele e trabalhando.
        Muito obrigado pela força. Fique com Deus! Grande abraço também!

  • Fabio Castro disse:

    Eu sou leigo, mas na minha humilde visão a sua estratégia contra o Alistair parecia estar dando muito certo. Você estava encaixando bons low kicks e ao mesmo tempo fazia ele recuar quando você ameaçava entrar com soco, fazendo você ter um domínio no início da luta. Tanto que ele me pareceu ir pra cima de você de uma forma como quem estava irritado por estar perdendo território no ringue, infelizmente ele conseguiu acertar aquela joelhada na segunda tentativa.
    Gostei muito de saber da sua jornada de treinos nesse texto! A sua evolução estava ótima e acho sim que você tinha tudo para ser um novo Ernesto Hoost por causa de algumas características de luta que vocês tinham em comum na minha visão.

    1. Ewerton Teixeira disse:

      Obrigado Fábio!
      Pena que o tempo não foi suficiente…
      Acho que para a adaptação de um esporte para outro o ideal são três anos. Mas enfim, deu para fazer bastante coisa legal.
      Obrigado pelo comentário e grande abraço!

  • Jucy Machado disse:

    Sensei acredito que nem preciso falar da admiração que nossa família tem por você, por sua história e cada vez que leio descubro mais um pouco do quão importante foi construir essa trajetória. Ahh mais um vez nós e principalmente o Heros se inspira com seus textos . Parabéns! Continue …e a idéia do livro é sensacional.

    1. Ewerton Teixeira disse:

      Muito obrigado. Espero que vocês todos estejam bem.
      Pois é, é importante não só passar pela carreira mas tirar aprendizados dela, e compartilhar com quem almeja a mesma coisa.
      Um grande abraço a todos vocês.

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