Meu primeiro grande campeonato internacional; com vídeos

Tempo de leitura: 10 min

em fevereiro 5, 2021

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Meu primeiro grande campeonato internacional; com vídeos

Dia 10 de junho de 2001 foi realizado, em Osaka, o segundo campeonato mundial por categoria de peso de karate kyokushin, o primeiro grande campeonato internacional em que eu participei.

É difícil esquecer esta data porque minha expectativa para lutar nele era grande, pois este seria meu primeiro grande campeonato internacional.

Na época eu estava com 19 anos de idade, faixa marrom, e havia passado por uma seletiva bem dura para conseguir minha vaga na equipe que iria representar o Brasil neste evento.

As seletivas haviam sido ao longo do ano 2000, e nelas lutei contra adversários experientes, e com muita vontade de participar deste campeonato.

Na época eu pesava pouco mais de 90 quilos, e tive que decidir se lutaria no peso pesado ou no meio pesado. Optei por lutar na categoria pesado.

Vencendo a seletiva no final do ano 2000, foquei primeiramente em me recuperar das lesões obtidas nestes torneios.

O treinamento para meu primeiro campeonato internacional

Após a seletiva final, realizada em novembro de 2000, passei o restante do ano treinando apenas no horário das aulas, junto com os alunos. Assim, poderia me recuperar das lesões, para que pudesse fazer uma boa preparação no ano seguinte, já que teria longos meses até o campeonato acontecer.

No início do ano de 2001, a equipe brasileira se reuniu, e os treinos começaram a ser realizados semanalmente.

Todas as quartas-feiras, a equipe brasileira se reunia para que todos treinassem juntos. Nos outros dias da semana, eu treinava com os membros da academia que eu representava, a Liberdade.

Uma grande vantagem que eu tinha é que a Liberdade contava com mais quatro representantes neste torneio: Riyuji Isobe e Autilio Rosa (peso leve), Fabiano Silva (meio pesado) e Sergio da Costa (pesado).

Isso me dava muita vantagem, pois a maioria deles já tinha experiência internacional, e sabia como era participar de um torneio deste porte. Além disso, treinar com outro representante da minha categoria possibilitou que eu tivesse uma melhor preparação, tanto física quanto psicológica, do que eu enfrentaria no torneio.

Este meio ano de preparação foi, sem dúvida, um dos períodos de treinamento mais duros pela qual eu já passei, especialmente os treinos com a equipe inteira, liderados pelo shihan Francisco Filho.

Os meses passavam e a expectativa só aumentava. Queríamos pôr logo em prática tudo aquilo que treinamos durante este período, mas o tempo parecia passar bem devagar.

Até que finalmente chegamos à última semana de treino e, enfim, ao dia da viagem.

A viagem

Esta viagem tem um sabor especial por ser a primeira vez que entrei em um avião na minha vida. É engraçado que, logo em minha primeira viagem de avião, já fui direto para o outro lado do mundo.

Pegamos um voo da Japan Airlines com escala nos Estados Unidos e chegamos ao aeroporto de Narita. De lá, mais um voo até Osaka.

Apesar de toda aquela situação ser nova para mim, minha cabeça só tinha espaço para uma coisa: vencer o campeonato.

Sim, eu estava indo para vencer. Não considerava que este seria um campeonato “apenas para ganhar experiência”, e sim como a oportunidade de me tornar o mais jovem campeão mundial da história, ainda na faixa marrom.

É claro que eu sabia que enfrentaria lutadores muito mais experientes do que eu, mas estava concentrado no que eu podia fazer, e confiante no treinamento que havíamos feito.

Então, eu encontrava formas de me convencer de que vencer era realmente possível.

Chegar ao Japão foi uma experiência incrível.

O Brasil é um país onde muitas etnias e culturas se misturam. Por isso, ao chegar e me deparar com um lugar onde praticamente só há uma etnia foi um choque muito grande.

Outra coisa que me chamou a atenção foi a mistura que existe entre o Japão tradicional, com castelos, templos e algumas meninas usando quimonos, e o moderno, com os vários arranha-céus, letreiros enormes e carros de luxo.

A culinária de lá também me encantou. Eu já tinha o hábito de comer pratos japoneses no Brasil, mas poder experimentar a versão original desta culinária foi fantástico.

Saímos do Brasil na segunda-feira à noite e chegamos no Japão quarta-feira de manhã, com 12 horas de diferença de horário.

Fui alertado para, mesmo que sentisse muito sono, não dormir durante o dia, pois isso faria com que meu corpo demorasse mais para se adaptar à essa diferença.

Segui a orientação, mas não foi fácil. Senti muito sono no primeiro dia, mas sabia que teria que me adaptar o mais rápido possível, pois teria que lutar já no sábado.

Outra coisa que me deixava bastante empolgado era encontrar os lutadores que eu conhecia somente por vídeos de outros campeonatos no hotel e nas proximidades.

Para mim, isso ajudou a entrar no clima da competição e manter a mente focada no que eu havia ido fazer. Não via a hora de poder mostrar meu potencial para o mundo pela primeira vez.

Minha participação no campeonato

No dia anterior ao campeonato, os atletas se concentram em uma sala, onde recebem o número que será costurado na parte de trás do dougui, e alguns brindes, incluindo a revista oficial do campeonato.

Ver minha foto pela primeira vez na revista oficial do campeonato foi muito empolgante, mesmo que não fosse entre os lutadores destaque do evento.

Vi a foto do lutador com quem eu faria minha primeira luta. Era um polonês chamado Tomasz Najduch.

No dia do campeonato eu estava muito animado. Nunca havia lutado para uma plateia tão grande quanto aquela que estava presente no ginásio aquele dia.

O campeonato começa e minha animação aumenta.

Para mim, era uma alegria muito grande dividir o mesmo tablado com atletas renomados como Kazumi Hajime, Piotr Sawick, Alexandr Pichkunov, Yasuhiko Kimura, Sergio da Costa, Riyuji Isobe, Gary O’neill, Kentaro Tanaka, entre tantos outros.

Mais ainda por alguns deles fazerem parte da minha categoria, e haver a possibilidade de enfrentá-los.

Minha vontade era de acompanhar as lutas de todos os brasileiros, mas fui sabiamente aconselhado por meu professor, Riyuji Isobe, a não me deixar levar emocionalmente pelas lutas dos meus companheiros e me concentrar nas minhas lutas.

É claro que, tanto neste, quanto em outros campeonatos que participei, sempre fiz o que estava ao meu alcance para ajudar os outros membros da equipe, mas sempre mantendo a distância emocional necessária para cumprir minha missão, que era lutar.

Esse foi um ensinamento que levei por toda a minha carreira, e que me ajudou bastante a ter foco durante os campeonatos que participei.

Chegou o momento de eu lutar. Enfrentei Tomasz e venci pela decisão dos juízes, após uma luta dura.

Minha segunda luta foi contra Atsushi Kadoi. Após um empate, perdi a luta pela decisão dos juízes.

Fiquei devastado, pois queria muito ter vencido aquele campeonato, e havia me convencido de que era capaz.

Hoje em dia, analisando friamente o meu nível físico e técnico neste campeonato, dificilmente conseguiria sair de lá campeão. Porém, eu tinha bastante confiança no treinamento que eu havia feito, principalmente por ter treinado com o campeão pan-americano da época, Sérgio da Costa. Estávamos na mesma categoria, e eu considerava que não ficava muito atrás dele nos treinos, então isso me dava bastante confiança de que eu poderia me classificar bem, ou mesmo vencer este campeonato.

Porém, eu vi que para vencer um mundial, eu ainda tinha um longo caminho…

O que me chamou a atenção em meu primeiro campeonato internacional

Por ter sido meu primeiro grande campeonato internacional, a quantidade de aprendizados e experiência que consegui adquirir foi enorme.

Algumas na prática, por meio das minhas lutas, e outras por assistir a outras lutas, e aos acontecimentos nos bastidores.

Pude perceber o quão importante é estar preparado emocionalmente para lutar um mundial, pois via atletas que fizeram uma longa viagem até o Japão entregarem suas lutas com muita facilidade, não por serem inferiores física ou tecnicamente, mas por estarem com medo do adversário.

Não conseguia entender como alguém não conseguia controlar medo na hora de lutar. Porque medo todo lutador tem, mas é obrigação dele aprender a controlá-lo. E isso é uma coisa que pode ser trabalhada, mas leva tempo. Quem já tem este autocontrole desde o início, consegue avançar mais rápido na carreira de lutador.

Aquela foi a primeira vez que vi alguns dos participantes deste campeonato lutarem ao vivo.

E alguns me deixaram realmente impressionado. Alguns deles são:

Riyuji Isobe

Eu treinava com ele todos os dias, mas nunca o havia visto lutar ao vivo.

Fiquei admirado com o modo como ele lançava potentes sequências de socos e chutes, e como aplicava o kubi geri (brazilian kick) no momento certo (na verdade, seus potentes golpes na costela do adversário o obrigavam a baixar a guarda, momento em que ele aplicava o chute).

Acabou perdendo a semifinal e terminando o torneio em quarto lugar. Porém, foi o único brasileiro deste campeonato a conseguir se classificar entre os quatro melhores da categoria e, na minha opinião, o dono da melhor técnica na categoria leve.

Yuki Fukui

Foi a primeira vez que vi alguém lutar com a guarda baixa o tempo inteiro com tanta tranquilidade, e sem levar um chute na cabeça. Sua frieza e calma na hora de lutar me deixaram admirado.

Fukui não desperdiçava golpes, conseguia atacar sempre no momento certo.

Assista às lutas da categoria leve no vídeo abaixo.

 

Hosro Yagubi

Fiquei impressionado com o iraniano Hosro Yagubi por dois motivos. O primeiro é que nunca havia visto alguém tão graduado participar de campeonatos. Se não me engano, neste campeonato ele era quarto ou quinto dan.

O outro motivo foi o ippon que ele aplicou em Maxim Bakushin em sua primeira luta no torneio. Foi um espetacular tobi nidan mawashi geri que continua sendo um dos meus ippons preferidos até hoje.

Esta luta faz parte da categoria médio do campeonato, e você pode assistir abaixo.

 

Sergei Osipov

Osipov era um matador. Assistindo-o em ação, pude ver o karate em seu nível mais alto.

Era impressionante sua frieza e a maneira como desferia golpes tão potentes.

Sua tática de luta também foi algo que me deixou bastante admirado. Ele basicamente se concentrava em desferir potentes socos na barriga (perto da bexiga, na verdade) do adversário, obrigando-o a baixar a guarda. Quando ele via que a atenção do adversário estava toda em defender seus socos, soltava seu mawashi geri matador na cabeça do adversário, vencendo por ippon. Fantástico!

Osipov fazia parte da categoria meio-pesado. Abaixo você pode assistir às lutas da categoria.

 

Sérgio da Costa

Sérgio era, além de meu companheiro de treino, alguém por quem eu tinha (e ainda tenho) muita admiração.

Fez sua segunda luta do torneio contra Hajime Kazumi, e desde o início não se intimidou. Foi para cima de Kazumi e usou todas as armas que tinha. Lutou até o fim com muita garra e em nenhum momento demonstrou fraqueza.

A luta foi declarada empate por duas vezes, sendo Kazumi declarado o vencedor após a segunda extensão.

Apesar do resultado, ele me mostrou na prática o que é lutar com garra.

Sergei Plekhanov

Foi um dos atletas que me deixou mais impressionado neste campeonato.

Extremamente agressivo, e com um olhar vidrado, Plekhanov foi um dos atletas que me mostraram o que esperar dos lutadores russos nas minhas próximas participações em campeonatos.

Seu estilo de luta baseado na agressividade e no aumento do volume de golpes quando a luta está perto do final foi uma grande influência para mim.

Abaixo, o vídeo com as lutas da categoria pesado, em que Sérgio, Sergei e eu lutamos.

 

Aprendizados adquiridos em meu primeiro grande campeonato internacional

Bom, como dito anteriormente, este foi um campeonato que me trouxe muito aprendizado.

Em primeiro lugar, agora eu sabia em que nível eu me encontrava entre os lutadores de karate kyokushin do mundo. Com isso, eu sabia exatamente o que precisaria melhorar para chegar no mundial aberto com mais chances de vencer.

Entendi a grande influência que o controle emocional tem no modo como uma pessoa luta, e como alguns lutadores sabiam como explorar o descontrole do adversário. Percebi que precisava aprender como exercer essa influência sobre meus adversários.

E finalmente, aprendi como é viajar até o outro lado do mundo para lutar, e tudo o que envolve a participação de um atleta que compete no mundial. Ter participado deste evento tão jovem, com certeza acelerou minha carreira como lutador.

Então esta foi a minha participação no Segundo Campeonato Mundial por Categoria de Peso de Karate Kyokushin. Espero que tenha gostado. Deixe seu comentário para dizer o que achou. Até a próxima!

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3 Comentários

  • Jucy Machado disse:

    Sensei você é sem dúvida, um dos grandes nomes no Kyokushin. Mais que um lutador, alguém que observa o mundo e as pessoas com uma naturalidade de dar inveja. Eu me sinto muito inspirada com seus artigos e leio para o Heros em voz alta para que grave na cabeça, no coração e se possível em suas ações. Grande abraço

    1. Ewerton Teixeira disse:

      Muito obrigado. Fico muito feliz por vocês acompanharem meus artigos. Um abração para todos vocês!

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